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Meditação sobre a cidade:
O teatro segundo Jorge Silva Melo

(in:  Letras. Sinais (para David Mourão Ferreira, Margarida Vieira Mendes e Osório Mateus).
Org. Cristina Almeida Ribeiro et al. Lisboa: Cosmos & Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1999, pp. 461-174)

Maria Helena Serôdio

...os clamores da cena não morrem na tinta da palavra[1]
Osório Mateus

1.

A propósito de Os Amantes Pueris de Crommelynck, interrogava-se Osório Mateus sobre o teatro hoje e, falando do realismo nesse contexto, escreveu: «a regra do jogo pode (deve) ser a manifestação do combate. E o teatro será de dúvida, de ironia, de luta. Hoje, num Portugal de estação indecisa, fazer teatro que agrade à história vai ser também fazer este [...] teatro»[2].

Há nestas palavras, é evidente, a memória de Brecht, «o pai destas coisas todas» de que fala ainda OM na mesma publicação, e cujo texto teórico maior - Pequeno Organon para o teatro - ele recomendava que se relesse ... ou lesse[3]. Podemos, de resto, perceber, na análise rigorosa e lúcida que OM pratica sobre o teatro, muitos dos pressupostos epistemológicos, filosóficos e artísticos que Brecht usou na sua vasta, complexa e interrogativa reflexão sobre o procedimento teatral, mas que, infelizmente, nem sempre foram (/são) entre nós compreendidos, sequer equacionados, na sua exacta dimensão crítica.

Todavia, nas formas e registos diversos, por que passaram em Portugal, desde meados dos anos 60, a leitura de Brecht e o exercício teatral em torno da sua obra (este sobretudo depois de 1974), faz sentido destacar um percurso individual que ultimamente tem vindo a manifestar-se nas diferentes instâncias criativas que o teatro consente - a escrita dramática, a construção cénica, a reflexão teórica e crítica - e que, a meu ver, representa uma interpelação brilhante do teatro como o viu e praticou Brecht. Trata-se de Jorge Silva Melo, esse outro homem de teatro que, (quase) pelo mesmo tempo que Osório Mateus, passou pela Faculdade de Letras de Lisboa e a ele se associou, então e posteriormente, em diversas iniciativas editoriais e teatrais.

Não pretendo fazer aqui a análise exaustiva de uma carreira que pelo teatro e pelo cinema se tem vindo a configurar num recorte muito pessoal e de valor incontestado, mas tão só acompanhar alguns dos filamentos que definiu programaticamente e praticou artisticamente a partir de 1993 e que, de certo modo, entram, em finais de 1997 e início de 1998, numa outra fase de reequacionamento. Refiro-me à explícita enunciação de um compromisso teatral que passa por exigências dramatúrgicas, representacionais, cénicas e políticas, e cujos contornos foram sendo definidos em torno dos espectáculos Seis rapazes, três raparigas (Escola de Teatro de Évora, 1993, Comuna 1993), António, um rapaz de Lisboa (ACARTE 1995, Teatro Tivoli 1996), O fim, ou tende misericórdia de nós (Culturgest 1996, Litografia Portugal 1997, já no contexto da nova  companhia que entretanto fundara, os Artistas Unidos) e a sequência de Prometeu, rascunhos (Teatro Municipal de Almada 1996, Comuna e Teatro da Trindade 1997). Todos eles, com excepção do primeiro, tiveram o seu texto-base publicado em livro (acompanhado de reflexões e proposições teóricas do autor/encenador), o que constituirá, no seu conjunto, o corpus a analisar.

O termo final da série artística, que aqui acompanho, coloco-a na encenação de Num país onde não querem defender os meus direitos, eu não quero viver, sobre texto de Heinrich von Kleist[4] (Espaço do Ginjal, em Cacilhas, 1997) e de A tragédia de Coriolano, de Shakespeare, que se apresentou no Teatro Rivoli, do Porto, em Janeiro de 1998. Não que eu desconheça o vínculo argumentativo e estético que une estes trabalhos aos que atrás referi: fazem, de resto, explicitamente parte do projecto Prometeu, ruínas, que se inaugurou depois do espectáculo no Teatro da Trindade. Mas considero que representam uma outra deriva possível por um teatro político que, neste caso - de assumida opção pelo corpo canónico da literatura novelística e dramática -,  vai prescindir dos textos contemporâneos que, a partir de 93, JSM veementemente reclamou (e escreveu) para a cena portuguesa. Prosseguem, todavia, a senda da sua maior reivindicação: a de uma «poesia da palavra política»[5], e é justamente nesse vértice de sentido que JSM recorda Brecht, «o autor que neste século mais trabalhou o teatro como poesia da política»[6], e que (por isso mesmo) também releu e interpelou Shakespeare. Como o fará Heiner Müller, esse outro herético seguidor de Brecht que JSM reclama para a linhagem do teatro que defende e pratica.

2.

...o teatro, defendo eu, fala da
 confrontação do homem com a História...[7]

Na «hipótese» que Jorge Silva Melo coloca em Seis rapazes, três raparigas, encontramos sinalizados já alguns dos princípios - dramatúrgicos e teatrais - que irá aprofundar e reelaborar em obras posteriores e que passam a definir um corpo consistente e singular de prática teatral.

 É, por um lado, uma dramaturgia que interpela ou usa outros textos (numa assumida intertextualidade) e que, na sua composição, acompanha os ensaios (para a preparação do espectáculo) ou exercita-se em seminários de escrita teatral. Assegura, deste modo, uma participação colectiva que, incluindo já elementos do elenco do futuro espectáculo, provoca ressonâncias de temas e motivos, aprofunda e complexifica o esboço das personagens, dispersa sentidos, gestos e presenças, importa a linguagem coloquial eivada de modismos, erros gramaticais e calão, e aceita já (comprometendo) os actores no processo criativo do texto a dizer e a figurar cenicamente. E esse texto  surge sempre invocado na sua constitutiva provisoriedade - de rascunhos, versões várias, o aleatório do «espectáculo final» - como exemplarmente se resume na expressão: «Se está pronto o texto? O de hoje está»[8].

É, por outro lado, uma gramática composicional que 1. mistura diálogos com narração, discurso directo com indirecto (até no interior de uma só réplica), 2. transita da fala monologada ou dialogada para a voz que canta ou recita (canções em voga ou passos de textos «célebres»), 3. sobrepõe os planos temporais de passado, presente e futuro (na conjugação verbal e na construção «caótica» de cada cena e das cenas entre si, num esquisso de pluriperspectivação), 4. repete frases, gestos ou incidentes num processo de construção anafórica ou de refrão (que pode ser «ruminante»[9] se por aí se fixar o limite do obsessivo), 5. desenha personagens cuja consciência «ingénua» ou, mais rigorosamente, cuja «falta de consciência de si»[10] provoca o «descentramento» das suas peças (isentas, portanto, de um sentido «moral»), 6. assume, como eixo do fazer teatral, a palavra na sua contraditória solicitação: «funcional e lírica, evocativa e eficaz, colorida e pertinente e trivial»[11], por aí criando o que se poderá considerar justamente uma poética do quotidiano e do «trivial» (numa clara evocação tchekoviana),  que é também, como veremos, uma poética do político.

Isto porque, no plano da sua funcionalidade estética, o teatro de JSM aspira a  ser um teatro político, ou seja, próximo do que foi em tempos: «o próprio corpo do pensamento e vivência concreta da Cidadania - da História e da Política»[12]. Isso implica, entre outros pressupostos, a defesa do valor da palavra contra o «espectáculo»[13], o do tempo presente contra a contemplação do passado,  o dos lugares próximos (a nós) contra a evocação de outros lugares distantes ou inexistentes, o da linguagem do quotidiano contra a da elaboração literária. Tudo a configurar um teatro que possa ser a voz da cidade, registando as expectativas, medos, contradições, problemas, alegrias e fracassos que assaltam e modulam a vida no mundo de hoje.

Trata-se, por isso, de um teatro que procura representar «os gestos com que vivemos», «um texto de hoje com palavras de hoje» onde se possa falar «das pessoas que sobrevivem e se esganam por sobreviver» sem que sejam olhadas com desprezo[14]. Só que na convocação desse fresco social, onde claramente predominam os jovens, não opera o «regular» (e regulador) registo naturalista, antes se exercita a construção e montagem de cenas que, partindo de «estilhaços do real» e da confrontação de processos discursivos (a linguagem do quotidiano de encontro aos referentes culturais e literários citados na sua literalidade) compõem uma representação realista que é consequência de um olhar crítico sobre o mundo e a vida.

Por um lado, nesse universo dramático entram figuras sociais que, no geral, andam arredadas da (ou distorcidas na) dramaturgia contemporânea, como o operário, a mulher da limpeza, o arrumador de carros, a camponesa, o funcionário público, os jovens que procuram um primeiro emprego, o polícia, o toxicodependente, o soldado, entre muitos outros. E, por outro lado, mais do que «explicar» (racionalizando ou moralizando) personagens e situações, o esforço é para se apresentarem os «dados do problema» numa verificação «materialista» e histórica, o que abre a uma zona de hesitação (e fascínio) por onde passa não só a exigência de posicionamento do espectador, mas também, e claramente a meu ver, a possibilidade do trágico.

Neste sentido, seria interessante reler Brecht que, sabemos, em vários momentos da sua carreira explicitamente rejeitou o trágico[15], não porque considerasse o sofrimento como estando ausente do mundo, mas porque esse sofrimento surge a seus olhos como desnecessário. Essa, de resto, será uma das razões por que irá regressar várias vezes à interpelação de textos trágicos da tradição dramática (Antígona, Coriolano...), chegando a reescrever a tragédia coral de John Millington Synge, Riders to the Sea, em Die Gewehre der Frau Carrar para provar (entre outras coisas) a possibilidade de alteração «do destino». Mas também em várias das suas peças lemos essa inscrição da possibilidade do trágico, ainda que numa composição dramatúrgica que expõe a sua «evitabilidade», como, por exemplo, em Mutter Courage und ihre kinder. Trata-se, portanto, de levantar uma hipótese, assinalar a sua «presença» nos afazeres do homem e, enfim, provar a sua imputada dispensabilidade.

No universo dramático de JSM que aqui nos ocupa há também, a meu ver, um trabalho em torno dessa problemática do trágico, embora me pareça mais «emotiva» a modalidade da sua inscrição na vida representada, como veremos mais adiante.

Voltando, porém, à enunciação do específico fazer teatral de Jorge Silva Melo, tal como nos surge no processo que aqui avalio, há ainda a referir as alusões concretas à construção espectacular que, para lá da natureza e função do teatro, reflectem sobre a possível representacionalidade do palco. É assim que já em Seis rapazes, três raparigas JSM nos diz que o «teatro não serve para reviver uma história, mas sim para a evocar», o que, de algum modo, implica uma forma de representação por parte do actor que o faça transitar da «identificação» com a personagem para o «distanciamento» crítico (não longe, é bem de ver, do Verfremdungseffekt brechtiano), e que se traduz, ou na referenciação das réplicas ao próprio nome do actor (o que acontece em Seis rapazes...), ou nos efeitos discursivos que fazem o actor transitar numa só réplica para o discurso indirecto, por exemplo.

No plano cenográfico (realizado nos espectáculos, indicado nas didascálias e pressentido na própria composição dramatúrgica) regista-se geralmente a ideia de construtividade de um espaço[16]. Há, assim, uma recusa de qualquer «parede» ou outros limites precisos para a cena, enquanto vários adereços são dispostos em aparente desordem pelo chão, entre os quais várias cadeiras, que constituem elementos indispensáveis e estruturantes. Os actores vão mobilizando estes adereços num contínuo movimento de reconfiguração do palco, associando-se, deste modo, a indecisão do espaço de acção (o  que acolhe a dispersão permanente que faz a sua dramaturgia) à concreta interferência «produtiva» dos actores. Essa variabilidade da imagem do palco é ainda acompanhada por uma constante mudança de roupa que, de resto, se realiza de forma discreta e que reforça a ideia de «rotação» permanente da acção, ao mesmo tempo que aproxima a representação por parte dos actores da inconstância de figurinos tornada possível na imagem cinematográfica.

Por outro lado, se colectiva é já a prática discursiva que antecede e «prescreve» o espectáculo, a construção cénica, sob a orientação de JSM, integra outros agenciamentos artísticos num projecto de explícita  colaboração autoral. É cada vez mais persistente a intromissão de um criador coreográfico (João Fiadeiro), de um director musical e coral (Jorge Eduardo Rocha), e de uma cenógrafa e figurinista (Rita Lopes Alves), o que, evidentemente, não anula a sua função quer de autor da peça[17], quer de encenador do espectáculo. Mesmo que, em muitas das intervenções jornalísticas e passos de enunciação teórica, JSM se declare em franca oposição relativamente à figura do «encenador», considerado por ele como empresário ou «director-geral».

3.

Se é possível identificar na obra de JSM e desde o seu primeiro texto, uma forma específica de escrever para teatro, a verdade é que também é visível uma elaboração cada vez mais cuidada e dramaturgicamente mais consistente no trajecto que aqui acompanho.

Na composição de  Seis rapazes, três raparigas, verificamos que a escanção das cenas não obedece a critérios de unidades de tempo, lugar ou constelação de figuras. Passa-se de um quarto ou sala para as escadas do metropolitano (pela liberdade da voz narrativa que assim ordena, sem preocupação de fazer a passagem naturalisticamente verosímil), e refere-se a cervejaria, o ginásio ou uma paragem de autocarro como lugares onde podem estar as personagens. O tempo não ordena a «história» de forma linear, e, embora eleja o presente como «lugar de cena», não deixa de transitar, desordenadamente, da recordação do passado à projecção no futuro (disfórico em quase tudo). Ainda assim, regista o texto uma macro-ordenação: uma primeira parte intitulada «Inverno Primavera Verão 1993 e uns anos antes», uma segunda «Prometeu agrilhoado - um bocado, agora» e uma terceira «Que é feito deles?».

Há nesta estruturação uma certa debilidade composicional, mas estão já presentes aqui alguns dos elementos que fazem a especificidade do universo teatral de JSM: a manifesta citação de passagens de outros textos que serão, de resto, retomados mais tarde (o Manifesto Comunista, de Marx e Engels, e a tragédia de Ésquilo), a ideia de um mundo que «gira» continuamente (e que é simultaneamente forma de referir o tempo histórico, da crónica, e a deambulação das personagens que se vão cruzando ao acaso pela cidade), e o desenvolvimento de conflitos e temas que obsessivamente vão marcar este mundo. É a difícil relação entre filhos e pais, os desencontros afectivos, a degradação inexorável das relações e dos ideais, o envelhecimento do corpo, a dificuldade de arranjar emprego (aqui exercitada, de forma admirável, na entrevista para uma multinacional em diferentes vozes, registos e modulações), a emigração (e imigração), a toxicodependência, e, em parte ligada a esta problemática, a morte.

É justamente esse sentido disfórico de degradação inexorável e a presença activa da morte que introduzem a possibilidade do trágico. Criam quer uma atmosfera emocional, quer núcleos de conflito dispersos. Será aqui o suicídio de um jovem, o aborto (temido, considerado como talvez necessário, entretanto acontecido), o assassínio de uma jovem que um homem encontra na paragem de autocarro, bem como o caso de um polícia que mata o drogado que cantava à noite num banco de jardim.

Estes elementos, que aqui surgem apenas esquematicamente sinalizados (e por isso insuficientes para a criação do trágico) serão desenvolvidos de forma mais consistente na peça que a seguir escreveu:  António, um rapaz de Lisboa. As razões dramatúrgicas de uma construção mais coesa decorrem de uma mais concreta definição espacial, de um melhor desenho das personagens (sobretudo, e de forma notável, a figura da mãe) e da escolha de uma delas para figurar o protagonista[18]. De resto, e curiosamente, esse António que aqui surge tem a sua pré-história já em Seis rapazes, três raparigas: a mesma idade, os mesmos problemas com a droga, relações difíceis com a companheira, a entrevista para o emprego, e até o próprio nome.

Todavia, esta «unidade» dramatúrgica de António, um rapaz de Lisboa não se traduz numa limitação ou estreitamento de sentido, na medida em que é justamente composta de multiplicidade e contradição. Por um lado, Lisboa, sendo lugar de referência ordenador que permite «reconhecimentos» vários, surge sobretudo numa multiplicidade de ruas e lugares, cujos nomes são ditos por vezes em sequências cerradas, quase em litania, figurando um labirinto urbano onde se perdem, cruzam e desencontram as pessoas.  E o próprio protagonista não é «figura plena» no sentido de lhe ser atribuído um recorte psicológico, um objectivo de acção ou um fundamento de discurso confessional, nem a ele cabe um «espaço moral privilegiado». É antes um «lugar vazio» por onde acedemos a uma visão perplexa do real: é forma de entrarmos nos lugares de Lisboa, de observarmos as determinações e solicitações de uma existência que se não domina, de acompanharmos, enfim, uma quotidiana rotina sem qualidades: uma deambulação pelas ruas e pelos afectos, a contradição exasperada entre sobreviver e dever ser, o compadecido olhar sobre os outros, o desconforto de recorrer a estratagemas para resolver aflições prementes.

No bulício da grande urbe surgem vários tipos sociais num espectro que se situa entre a pequena burguesia e o lumpen, aqui representado pelo «eterno agarrado do bairro». E é no encontro e desencontro com eles que a figura de António vai construindo o seu possível estatuto de símbolo de uma geração que parece ter desistido do sonho e do desejo, e que vive e sofre um mal-estar difuso. A importância do corpo surge neste contexto referido quer à obsessão de o manter em forma (quando ser jovem se encontra com as determinações da moda), quer aos limites físicos por onde se insinua a doença, a dor, a dependência e a morte como destino à espreita. É aqui que localizo a disponibilidade para o trágico, que, de resto, se amplia na construção retórica de frases repetidas e refrãos, quer para traduzir momentos de conflito e sofrimento («as noites que é preciso ... caminhar pela cidade»), quer para compor formas corais que são as frases desgarradas ouvidas na cidade como possível refracção de uma voz comum («a máquina ficou-me com o multibanco», «a camioneta das 6 e 8», «era porreiro ficar neste escritório»).

Esta atenção à realidade quotidiana traduz-se ainda na referência a tópicos da «actualidade» como as obras (do metro) na Rotunda, Lisboa Capital da Cultura ou determinados  programas de televisão, e integra mesmo (como se refere em didascália) o trautear de canções em voga e até a leitura de jornais do dia. Do ponto de vista geográfico, a focalização em Lisboa - nas suas ruas, praças ou lojas - não dispensa a referência a outros lugares: Sevilha como o lugar da evasão, nostalgia e sonho (para Carmem) e Almada, como lugar sombrio e chuvoso onde se «perdem» os jovens.

Do ponto de vista da organização dramatúrgica, as triangulações -  Ana-António-Teresa, António-Teresa-Nuno, António-Carmem-André - servem a lógica caleidoscópica dos encontros e desencontros na cidade, mas apontam também para uma repetição cíclica (dos conflitos amorosos, da recaída na droga, dos tratamentos - da mãe - no Instituto de Oncologia) que, falando da rotina, introduzem, todavia, um sentido de degradação imparável. O reencontro impossível de António e Ana em Almada, a notícia da morte da Xana e do Xavier, e o silêncio comovido de António[19] são os sinais visíveis de que o trágico vive paredes meias com a vida destes jovens.

Na peça que a seguir escreveu - O fim, ou tende misericórdia de nós -,  JSM retoma alguns destes processos dramatúrgicos, insistindo quer na presença de «colectivos» (jovens num «forçado» enquadramento espacial), quer na figura de um protagonista (Mateus, também chamado o Benfica) que seja de algum modo expressão exasperada de perplexidades comuns. Mas compõe de forma mais convincente um universo trágico, de indecisa evitabilidade, através de uma  rigorosa construção da intriga, que passa, não apenas pela unidade de lugar em cada cena (o que permite a criação de atmosferas e a implícita sugestão de «determinações» exteriores para os comportamentos), mas também pela ordenação linear do tempo em sequências de visível exactidão cronológica. É o caso, por exemplo, das cenas 4 a 9 do 1º acto que descrevem o dia de sábado na  sua rigorosa sucessão de lugares e actos: desde a pesca de manhã perto do quartel, passando pela festa em Montemor até ao cometimento do crime na estrada.

A história parte de um caso real ocorrido na Sicília (em 1993) e relatado no jornal La Republica, a que o autor vai, porém, conferir uma identidade portuguesa. Encontra-se ainda com um outro universo - o de Woyzeck, de Büchner[20] - quer na evocação de um quartel e das atmosferas que a ele se prendem, quer em alguns traços do protagonista, como sendo «... calado ... metido com ele ... mas bom rapaz», « ... honesto ... cumpridor...»[21], parecendo não haver razão alguma que justifique o seu acto homicida. Partilha ainda com o protagonista de Büchner a capacidade visionária, o que permite não só distingui-lo dos outros (porque vê «ovnis»), mas também reforçar o clima trágico da acção. Porque se o aparecimento do fantasma de Sandra pode funcionar duplamente como evidência da capacidade visionária da personagem Mateus, mas também como distanciamento crítico, já todo o segundo acto, com a progressiva acumulação de desconfianças, pressentimentos e medos (derivados dessa propensão visionária) cumpre efectivamente o adensar trágico no desenrolar da acção.

Um quartel na província é o enquadramento ideal para reunir muitos jovens de diversas proveniências - geográficas e de classes socais -, e de diferentes comportamentos, ao mesmo tempo que permite a configuração de um universo masculino “duro“ e “coeso”, feito de comuns (e cúmplices) fantasias, obsessões e ansiedades. A  acção é reportada ao «momento de tribal iniciação» que é o serviço militar, onde faz lei «a exacerbação da virilidade»[22], o que, de algum modo se traduz na atenção ao corpo: o risco físico dos exercícios, a constante referência à comida, os cuidados com o corpo e os prazeres dos sentidos. Tudo isto configura uma atmosfera por onde circula o desejo hetero- e homoerótico, nas suas  fronteiras imprecisas.

Neste cenário humano amplo e diversificado, evoca-se a conversa errática onde se fala de comida, de concertos rock, de droga, de namoradas, de aventuras, da caça, de problemas sociais e familiares,  de travestis, de faits divers, de desastres, adultérios, negociatas, etc. Tudo numa linguagem vulgar, de calão, brejeira, obscena por vezes, recheada de piadas mais ou menos grosseiras, mas construída com um enorme rigor e consistência vocabular e estilística. Só que nesse tecido linguístico de verosímil naturalista irrompem dois tipos de linguagem outra que de algum modo o suspendem e lhe inventam um contracorpo discursivo: a leitura de passos do Apocalipse (por um dos magalas de cabeça entrapada) e o discurso poético que ora é evocação embevecida das delícias da caça lá na terrinha, ora é o assalto da cobardia, ora é a consciência de culpa aos gritos.

A acção terá o seu climax no assassínio bárbaro de uma jovem a seguir a uma rave party, onde foi consumida droga, e toda a análise de comportamentos a que se procede inclui uma auscultação profunda das deambulações de um espírito perturbado, subtilmente sinalizando as hesitações entre a assunção e a rejeição da culpa, a confissão e a delação, a consciência e o delírio. É aqui que penso encontrar ainda aquele traço de «esvaziamento» ou «não consciência de si», que atrás referi como categoria central do universo teatral de JSM, mas que neste caso abre mais decididamente à possibilidade do trágico.

Relativamente à estruturação do texto, há, depois do climax que constitui o fim do I acto, uma sequência de cenas do II acto, em que se acumulam ansiedades e pressentimentos vários, até um final forte que coincide com as confissões na esquadra. O terceiro acto, muito mais curto (com apenas três cenas), funciona como um epílogo, na medida em que revela o posterior suicídio do Tigre e de Mateus na prisão, mas serve também, creio eu, para enunciar razões possíveis para o que aconteceu a estas personagens. Se, no caso de Tigre, se referem razões familiares (de abandono por parte dos pais e de vida num circo em contacto com um trapezista que o inicia na droga), no caso de Mateus serve para o continuar a referir ao fascínio pela terra e pelos pássaros, bem como para expor quanto de aleatório terá havido no assassínio que cometera. Ainda assim, apesar destas possíveis razões de processo composicional, este III acto parece-me enfraquecer ligeiramente a arquitectura textual, ao apresentar-se como uma expansão talvez demasiado explicativa e com uma lógica de repetição (pelo reaparecimento do fantasma de Sandra)  que parece alheia à estrutura deste texto.

Isso não retira, porém, a esta peça a sua invulgar capacidade de declinar o trágico de uma forma intensa e emotiva, e quase sem paralelo na dramaturgia portuguesa contemporânea. Instaura uma ordem dramatúrgica que modula a acção em torno de um universo reconhecível de jovens que vivem hoje um mal estar difuso emblematicamente sinalizado na droga. E que pelas perplexidades, exaltações, cumplicidades, silêncio e dor evocados, acompanha aquilo que o autor refere como sendo a «opacidade do real, a sua falta de sentido, o terrível silêncio dos homens e de Deus»[23], visível talvez de forma mais clara nos chamados «casos do dia», como este que aqui se tornou eixo ordenador  da representação trágica.

4.

Enquanto estas obras experimentam a representação do quotidiano - a dramatização do trivial - o projecto que iniciou em 1996 em torno de Prometeu promove uma outra forma estrutural e visa um procedimento mais abertamente político. Foi no Teatro Municipal de Almada, em Julho de 1996, Prometeu: rascunhos à luz do dia, foi depois na Comuna em Fevereiro de 1997, A libertação de Prometeu: rascunhos, e foi, em Maio no Teatro da Trindade, Prometeu Agrilhoado Libertado.

Na edição da & etc - Prometeu: Rascunhos - encontramos os dois textos apresentados em Almada e na Comuna, cada um com um título diferente, embora entre si partilhem a referência ao titã, a ideia de uma escrita provisória («rascunhos») e a sugestão de uma sequencialidade entre o primeiro e o segundo texto (pelo uso do termo «outras»)[24]. Além disso, cada texto abre com uma observação genérica, espécie de subtítulo, que é moldura para os quadros que a seguir se alinham: no primeiro texto é «Algumas falas solitárias por cima do mar encapelado» (que inclui oito cenas), no segundo é «Outras falas solitárias por cima dos cemitérios» (que inclui nove cenas).

Estas «falas solitárias» implicam a situação exposta de uma figura exemplar (ou de quem o interpela) e têm a sua expressão dramática na dominância do monólogo. Com efeito, no total das 17 cenas, apenas 5 incluem diálogo, consistindo as restantes exclusivamente na fala de uma só personagem. O discurso é, em geral, ordenado em verso branco, curto e sem pontuação explícita, onde encontramos frequentes anacolutos, e onde a repetição anafórica (ou epifórica) cria ritmos fortes, definindo núcleos temáticos e imagísticos de grande expressividade. É, além disso, um monólogo atravessado de contínuas mudanças de registo: passa da pergunta à afirmação, e desta à súplica, à aporia, à apóstrofe, ao repto agressivo ou à exclamação magoada. Compõe, deste modo, um ritmo poético ofegante  que se reparte entre a exaltação, a mágoa e a revolta. No plano discursivo há, assim, nestas peças uma mais radical poeticidade, a par do exercício de diferentes formas de escrita: narrativa (2.7: «a história de um amor para quando começarmos a não querer saber dos deuses...»), descritiva (2.6: «louvor da palavra e dos velhos livros»), ensaística (2.5: «as frases do manifesto») e a glosa dramatúrgica (2.4: «o teatro de Io mais ou menos como vem em Ésquilo»).

As didascálias são poucas e restringem-se aos títulos das cenas, que nomeia(m) a(s) personagem (/personagens) interveniente(s) e referem alguns aspectos espaciais e temporais que a(s) contextualizam. É nas réplicas que encontramos mais referências espaciais, de modo que mais do que «ordenar» um espaço cénico de forma decisiva, os textos preferem a sugestão imaginativa e a evocação poética. E nessa sugestão cabem as contínuas formulações comparativas, estabelecendo paralelismos ou oposições, sempre multiplicando as instâncias espaciais e temporais de modo a equivalerem-se entre si lugares, tempos, acções e figuras diferentes:

... em baixo é o mar, não é... / nem sei / em baixo o deserto / aqui o rochedo (p. 9)
lá em baixo o mar / para os que estiveram presos em peniche / lá em baixo o mar
ou o deserto / tarrafal cáucaso (p. 10)
éramos nós que subíamos o monte e íamos onde quer que fosse / e o roubávamos
e Zeus / Zeus a gnr Zeus e o Eanes e o Barreto e o Sá Carneiro esses / que te mandaram a águia / a águia comer-te a barriga (pp. 32, 33)

Este processo de repetida comparação e metaforização não visa apenas tornar mais consistente uma rede imagística que amplie e torne mais rica e complexa a construção poética e dramática em torno das duas metáforas principais (do fogo e da águia); é também forma de articular a reflexão histórica e política em torno da revolução, propondo a confrontação (e analogia)  entre o mito e a história, o passado e o presente, a situação próxima de Portugal e momentos importantes da história do comunismo internacional.

É assim que, desde a primeira fala de Prometeu (pp. 9-14), logo a voz se multiplica, definindo-se esta figura como análoga a (ou substituível por) muitas outras que podem ser referidas ao gesto exemplar do titã: Rosa Luxemburgo, Lénine, Boukharine, Trotsky, Estáline, Gramsci, Che, Otelo, Salgueiro Maia... Encontram-se as figuras míticas (de Prometeu, Io, Oceano  e Hércules) com as figuras da história, e neste plano - da concreta razão da história - confundem-se as que deixaram conhecido o seu nome individual (entretanto tornado símbolo) com os anónimos que, todavia, na sua exemplaridade social, definiram modos de pensar, viver, fazer e sofrer a revolução. Será a camponesa comunista, os tipógrafos, o estivador, a operária que regressa a casa no cacilheiro (qual Io), os militantes comunistas, o trabalhador da construção civil, o republicano baleado na guerra civil da Espanha, etc.

A metáfora do fogo é referida à acção revolucionária e aos princípios e valores que a informam e norteiam, enquanto o rochedo ou penhasco é a cadeia (de Gramsci, Rosa Luxemburgo ou Otelo), o Cáucaso é Peniche ou Tarrafal, e a águia será a mosca que volteja (pp. 39, 73), uma bala na cabeça (p. 15), a consciência da traição e crimes cometidos (pp. 78, 80), a vida degradada que hoje nos é imposta (p. 58).

Alguns dos quadros nomeiam a sua proximidade quer a textos teóricos e literários, quer a documentos históricos: as «verdadeiras falas de Boukharine no seu processo  nos idos de Março de 1938, Moscovo» (1.6, ou seja, sexto quadro do primeiro livro); a «penúltima carta de Rosa Luxemburgo a Sonia Liebknecht datada de 12 de Maio de 1918 na cadeia de Breslau» (1.8); «o teatro de Io mais ou menos como vem em Ésquilo» (2.4); «as frases do manifesto de que o rapaz das obras havia de se lembrar em vendo no teatro o Prometeu agrilhoado...» (2.5).

A tragédia grega é assim ampliada e posta em confronto com outros lugares, tempos, figuras e textos, ao mesmo tempo que o protagonista (na sua variedade proteica) é visto como simbolizando uma atitude e uma acção que, sendo positivas, não podem deixar de ser questionadas. Em primeiro lugar porque estarão eivadas de um individualismo paternalista («devíamos ter ido nós roubar o fogo aos deuses / não devias ter sido tu / éramos nós / éramos nós que subíamos o monte e íamos onde quer que fosse / e o roubávamos»[25]), em segundo lugar porque eventualmente não eram desejadas pelos «homens» («os homens não queriam o fogo / o fogo dos deuses»[26]), e, por último, porque terá havido, na prática de alguns, a traição, o silêncio cúmplice ou a deformação do ideal.

Do ponto de vista da resolução dramática, estes textos, que se organizam como sequências aparentemente aleatórias de cenas[27], experimentam um final de apaziguamento e de alguma esperança difusa. É, na primeira peça, a convicção de Rosa Luxemburgo: «Assistimos agora / à derrocada / do mundo velho / todos os dias / se desmorona / dia após dia / todos os minutos / cai / o mundo o mundo velho. / O que me surpreende / é que a maior parte das pessoas não se apercebe / não percebe / e julgam / pensam / que estão a pisar a terra firme»[28]. Na segunda peça é um rapaz que numa sexta feira de paixão renasce na trivialidade de um quotidiano em Lisboa, nos gestos simples de se ir encontrar com a namorada do outro lado do rio, para com ela comer «três postas de pargo». Mas essa «liberdade», sabe-o ele, deve-a a muitos, por isso afirma «obrigado homens por a pouco e pouco com erros  e torturas obrigado por me terem libertado ... aos mortos devo a vida/ e o meu amor»[29].

Dir-se-á, porém, neste segundo caso, que se pode sentir uma certa desproporção entre o canto prometaico, na sua exaltação e mágoa, e esta «libertação» final, traduzida numa pequena satisfação individual, ainda que implique uma relação de amor e «comunhão». 

Não deixa, apesar de tudo, de retomar uma das traves importantes do projecto teatral que Jorge Silva Melo defende: a de representar «os gestos com que vivemos», falando de pessoas simples num quotidiano vulgar. Neste caso, porém, a convocação do modelo grego apelou, por um lado, a um discurso mais claramente marcado pela poeticidade e pelo aspecto coral (vários Prometeus que falam e são interpelados da mesma maneira) e, pelo outro, a uma referenciação explícita ao pensamento político, com o que isso implica de opinativo e polémico. Neste sentido, ainda que invocando o trivial neste ou naquele ponto, haverá um adensamento dessa experiência, na medida em que ela é confrontada e avaliada de encontro a referentes históricos e políticos precisos.

Por outro lado, e comparando com as outras três peças anteriores aqui analisadas, este Prometeu desenvolveu de forma diferente a sua articulação com o universo da tragédia: quer porque representa várias figuras e diferentes histórias reportáveis ao (mesmo) «protagonista», quer porque reflecte sobre a experiência passada mas não a presentifica cenicamente, quer porque ensaia uma outra relação com o público ao torná-lo mais claramente o seu real interlocutor.

Neste sentido os dois textos em torno de Prometeu, prosseguindo em muitos aspectos (mas superando artisticamente, a meu ver) uma experiência dramatúrgica e teatral iniciada três anos antes, ganha uma outra dimensão, talvez mais claramente comprometida com um teatro verdadeiramente político, o teatro que quer ser uma meditação sobre a cidade. Para que, parafraseando Osório Mateus, «os clamores da cena não morram na tinta da palavra».


[1] Osório Mateus, Escrita de teatro. Amadora: Bertrand, 1977, p. 226.

[2] Ibid., p. 226.

[3] Ibid., p. 193.

[4] Espectáculo construído sobre a novela de Heinrich von Kleist - Michael Kohlhaas, o rebelde, apresentada num solo de Paulo Claro.

[5] Jorge Silva Melo, «E se aqui viéssemos aprender, sim, à vossa frente aprender?», Programa do espectáculo A tragédia de Coriolano, Porto, Janeiro de 1998, p.4. Parcialmente este texto é reproduzido no Posfácio à publicação de A tragédia de Coriolano, na tradução de Manuel Resende (Porto: Edições Afrontamento, 1998), surgindo com o título «Notas no Inverno de 97» nas páginas 181 a 185.

[6] Ibid., p. 5. De resto, a provar a presença e o envolvimento de Brecht em algumas das preocupações estéticas de JSM, veja-se que para completar o ciclo Prometeu, ruínas, ele programou a encenação de A queda do egoista Johann Fatzer, de Brecht, numa versão dramatúrgica de Heiner Müller, que estreou no Teatro Variedades a 30 de Abril de 1998.

[7] Jorge Silva Melo, Introdução a Seis rapazes, três raparigas: uma hipótese, Évora, 1993, texto policopiado.

[8] Id., Introdução a António, um rapaz de Lisboa. Lisboa: Cotovia, 1995, p. 14.

[9] Ibid., p. 11.

[10] V. a leitura do teatro de Brecht feita por Louis Althusser em «Le Piccolo, Bertolazzi et Brecht: Notes sur un théâtre matérialiste», Pour Marx. Paris: Maspero, 1974, pp. 129-152.

[11] Jorge Silva Melo, Introdução a António, um rapaz de Lisboa. Lisboa: Cotovia, 1995, p. 13.

[12] Id., «O que ficou depois de quê?»,  Prometeu: rascunhos. Lisboa: & etc., 1997, p.181.

[13] Não se trata de recusar a necessária vocação teatral do texto, mas sim de pôr em causa a dominância no teatro do paradigma visual e espectacular que implica a opulência por vezes «operática» dos recursos cénicos, a predilecção pela magia do palco, a concessão ao divertimento e, enfim, a supremacia do encenador sobre o autor,.

[14] Id., Introdução a António, um rapaz de Lisboa, op. cit., passim.

[15] V. Raymond Williams, Modern Tragedy (1966). London: Chatto & Windus, 1969, pp. 190-204.

[16] Para uma análise um pouco mais explícita da componente cenográfica, ver o meu artigo «Teatro e cidadania: Jorge Silva Melo e o espectro de Marx», in Vértice, II série, n.º 81, Dezembro de 1997 (alínea 7. A redefinição cénica,  pp. 24 e 25).

[17] «Aquele que eu assino, «autor» a 100% destas páginas que fui propondo, reescrevendo, criticando...» (António, um rapaz de Lisboa, op. cit., p. 14); «Os textos dos segundos Rascunhos são, como os primeiros, escritos por mim. E discutidos por todos, pensados, respondidos» (Prometeu, rascunhos, op. cit., p. 185).

[18] Fiz uma primeira aproximação a este texto no artigo «Encenações do real: a propósito de António, um rapaz de Lisboa, de Jorge Silva Melo» in Caderno Vermelho, n.º 3, Outono/Inverno 1996, pp.39-42.

[19] Jorge Silva Melo, António, um rapaz de Lisboa, op. cit.: «A cantiga é estúpida mas faz lembrar coisas  a António. Que é um sentimental e sorri, comovido» (p. 160); André «... tás a chorar?», António «...entrou-me uma coisa para o olho...» (p. 165).

[20] Jorge Silva Melo., O fim, ou tende misericórdia de nós. Lisboa: Cotovia, 1997,  p. 4 (encima a lista de textos indicados como obras consultadas); p. 9 (lembrando a sua visitação teatral ao texto de Büchner em 1978, quando o co-traduziu e co-encenou para a Cornucópia, escreve: «...o que Bergman dizia: nunca se faz essa peça inacabada uma só vez. Hoje, arranjei esta maneira de voltar ao Woyzeck...»).

[21] Ibid., pp. 164, 165.

[22] Ibid., p. 10.

[23] Ibid., p. 9.

[24] Algumas das observações aqui inseridas sobre as peças deste volume (Prometeu: rascunhos. Lisboa: & etc., 1997) foram já publicadas no meu artigo «Teatro e cidadania: Jorge Silva Melo e o espectro de Marx» (Vértice, II Série, n.º 81, Dezembro de 1997, pp. 19-26), onde, todavia, me demoro mais na análise do texto e da sua representação cénica.

[25] Jorge Silva Melo, Prometeu: rascunhos, op. cit., p. 32.

[26] Ibid., p. 51.

[27] A reescrita e as diversas encenações tornaram, aliás, claro que se tratava de um assumido «work in progress».

[28] Jorge Silva Melo, Prometeu: rascunhos, op. cit., p. 87.

[29] Ibid., pp. 177, 178.