![]() |
Situação inesperada, talvez mesmo surpreendente, aquela com que deparamos, hoje, em Portugal, no que diz respeito ao ensino do Latim. Após um período que parecia ser de agonia e que se manifestou pelo quase total despovoamento das aulas de latim, somos, nestes momento, confrontados com uma situação de quase exuberância: milhares de estudantes, em todo o país (mas principalmente a norte do Tejo) frequentam esta disciplina. Só nos 10.º, 11.º e 12.º anos de escolaridade são cerca de 6000 os alunos inscritos. E o futuro não se mostra menos ridente: já foi afirmada a necessidade de integração da cadeira de Latim em currículos dos cursos de Línguas e Literaturas das Faculdade de Letras e de Ciências Humanas, que, nas reformas actualmente em vigor, não a contemplam.
|
Exige-se, ainda, e com algum eco a nível das entidades oficiais, que a disciplina de Latim passe a integrar os currículos de outros cursos do ensino secundário (História, Filosofia, Direito…).
Tudo parece indicar que o esforço antigos dos classicistas nacionais está a produzir resultados positivos e que, qual Fénix, o Latim renasce como força actuante no panorama escolar, e cultura, português.
Muitos são os motivos que justificam o estudo do Latim — e a referência a Latim e não a Língua Latina é intencional, já que aquela designação pressupõe que, a par da Língua, se concretize um estudo da cultura —, sobretudo se tivermos presente que Portugal é um país que utiliza uma língua derivada do Latim, língua essa que é também veículo de expressão oficial de outras nações, e onde, por outro lado, a cultura latina deixou vestígios evidentes. Razões culturais, científicas e pedagógicas justificam a inclusão do Latim nos currículos médio e superior, razões que, resumindo, vão desde a conclusão de que é uma peça indispensável para o desenvolvimento de uma mentalidade lógica à afirmação de que possibilita o aumento das capacidades de abstracção, memorização e racionalização, passando, evidentemente, pelo papel primordial como elemento de manutenção de uma tradição cultural e de estímulo no sentido estético. Embora Portugal não seja Roma, a cultura nacional passa, obviamente, de uma forma directa ou indirecta, embora não predominante, pela latina. Se Portugal aposta no futuro — e a integração na CEE parece querer provar a adesão a um espírito de novidade e de progresso —, não é possível continuar a desprezar a tradição cultural. Um país não se define apenas pelos seus rendimentos per capita ou pelo seu produto nacional bruto; é também culturalmente que as nações se afirmam e é com base na tradição cultural — que não é sinónimo de revivalismo nostálgico de um passado perdido — que evoluem. Esta tradição cultural não é, em si, um fim, mas, antes, um meio. Um meio de manter e divulgar, de relacional, de permitir a conservação, actualizada, de valores, e de compreender – exige-se principalmente uma tradição cultural que seja um modo de compreensão da vida, do mundo, do homem, do passado e do presente, de um presente que deve ter uma projecção no futuro. (…) Consciente da oportunidade do momento e do grande esforço desenvolvido pelo ICALP e pelo grupo de Latim do Departamento de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras de Lisboa para a preparação do Colóquio sobre o Ensino do Latim (Lisboa, Maio de 1987), CLASSICA decidiu lançar este número especialmente dedicado à situação do ensino do latim. Queremos publicamente testemunhar o nosso agradecimento do Prof. Dr. Peter Wülfing, que autorizou a publicação das comunicações do Colóquio de Tubinga sobre a situação do estudo das línguas clássicas (Romiosini Verlag, Köln, 1986), e à Prof. Dr.ª Maria Helena de Teves Costa Ureña Prieto, que obteve essa autorização e a ofereceu à CLASSICA. Decidimos acrescentar algo sobre o ensino do latim em Portugal, pelo que apelámos para o apoio do Prof. Dr. Aires Augusto Nascimento, do Dr. Manuel Rodrigues e do Dr. Raul Pissarra. Queremos também agradecer aos colegas que traduziram os artigos das línguas originais: Prof. Dr. Manuel Alexandre Júnior, Dr.ª Nazareth Sanches, Dr. Arnaldo Monteiro do Espírito Santo e Dr. Manuel Rodrigues. |
Victor J. Vieira Jabouille
Arnaldo M. Espírito Santo
Manuel dos Santos Rodrigues